sábado, 20 de agosto de 2016

Atípico

Acordei com saudades
De uma multidão
Vozes em meu coração
Afinidades

Nomes ecoam nos vales
Dentro de mim
Meus mundos enfim
Meus males

A minha pele arde
Fria
Desejo todos os braços
Que me abraçaram
Um dia

Encerrado num cubo
Minha sala
Sem a palavra
Sucumbo
Num choro que fala

Ao mundo que sinto falta de todos os que amo e que não estão aqui e me arrependo de te-los deixado ir...um dia.

Elemento

Sou pequeno
Minha roupa é maior
Minha casa também
Minha rua
Meu bairro
Minha Cidade
Meu Estado
Meu país
Meu planeta
Minha galáxia
Meu universo
O conjunto de universos
O inacessível Deus
Mas...
Eu existo.

sábado, 13 de agosto de 2016

Et pater liberos

Levantai, filhos meus,
Os olhos da terra,
E olhai para o horizonte,
Que o futuro encerra.

É lá que está o meu desejo
Da tua bem-aventurança.
Coisas que sonhei p'ra vós
Quando éreis esperança.

Ouvis, frutos meus,
Tão rígidos conselhos.
Sigais meus austeros passos,
Tenhai-nos como espelhos.

Pois sou eu portador da lei
E construtor de limites.
Guardai como ouro o que vos digo,
Para que não advenham dias tristes.

Façais das minhas bênçãos
Vossos caminhos
E vossas armaduras do meu labor.
Pois nunca sentirei-vos sozinhos
Se reconhecerdes o meu amor.

Oculto

Ha algo onde não pousam às vistas,
Algo iluminado que se esconde,
Algo que está não se sabe onde,
Coisas, porém,  não previstas.

O real é aquilo que não se percebe.
É o mundo do inusitado.
Aquilo que está ao meu lado,
Mas que minha mente não concebe.

Sou cego para o mundo,
E saber é uma ilusão,
Um sonhar amplo e profundo.

De que me servirá a visão,
Se o órgão que ve tudo
É o obtuso coração? 

Os meus olhos servem para produzir a beleza que eu mesmo crio, Deus que sou.

Shabat

Hoje o tempo é meu.
E o céu azul e as montanhas verdes são minhas.
Hoje é meu o tempo.
Mozart toca para mim
Acompanhado de um coro de passaros  no meu jardim.
Tocam e cantam para mim.
Sentado na minha varanda eu danço,
No meu imaginário mundo.
Hoje eu descanso,
E comigo descansam os Deuses.
E nos esquecemos de pensar.
E nos desviamos do labor.
Mozart e seus pássaros,
Eu e o meu cachorro.
Da métrica também descanso.
Tão óbvio seria se rimasse!

domingo, 7 de agosto de 2016

Cadeira

Na minha cadeira tem eu...
E o meu cansaço
Minha preguiça
Desejo de abraço

Tem o pássaro que passa
E a nuvem branca
Antigos amores
E a chuva franca

Tem muita saudade
De coisas antigas
Eternos remorsos
De infindáveis vidas

Na minha cadeira ha o tempo
Que passa sentado
Porque tempo não passa
Mas eu sou passado

Na minha cadeira tem eu...
E os meus desejos
Minhas nostalgias
E um livro de Drummond.

Varanda

Adoro o dia
Com às suas horas perfumadas
Pássaros em revoadas
E o piso que piso

Amo a árvore que mora comigo
E às suas folhas secas
Presente de outono ou primavera
Cheiro de flores frescas

Me regozijo com às montanhas
Que desfilam por minhas janelas
Maquiadas de nuvens e névoas
Merecedoras de aquarelas

Sentado na minha varanda
Sou rei do mundo
Útero fecundo da minha imaginação
Sou, de tudo, a raiz
Que prende tudo ao chão

Tudo é bom visto da minha varanda.

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Música

Ontem o meu amor me deixou
Foi viver numa ilha
Naufragou no caminho
Encontrei os restos na praia

Alguém me ligou a tarde
Não atendi, vingativo
Não me importei, furtivo
Fingi, não fiz alarde
(Foi engano)

Encontrei uma antiga fotografia
Apologia ao tempo perdido
Ode a escolhas erradas
Comuns ao dia a dia

Meu sonho era ser poeta
Impediu-me a alegria
Porque todo poeta é chato.

Autômato

Eu repito tudo
Tudo retorna
E se recolhe
Tudo volta a ser

A hora de ontem
Hoje se repete
Assim como o mês
Com seus trinta dinheiros

Um homem crucificado por dia
Outro amor que morreu
Outra guerra se inicia
Alguém nasceu ideologia

Funerais e aniversários
Casamentos e partos
Roupas e sapatos
Páginas de obtuarios

Amanhã acordo cedo
Depois de amanhã também
Hoje completo mais um ano
E de novo ano que vem

Tudo eu repito
Como a superfície da roda
Como o giro dos astros
Como eu no espelho
A mim mesmo imito

Infinitamente.