segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

O amor que nos traz a vida

--Eu não queria vir mas fui chamado e, quando aqui cheguei, percebi que me amavam e que o mundo era bom então, fiquei.

O amor é a chave que nos abre às portas do mundo.
A aqueles que nunca sofreram com a falta do amor familiar, mormente paterno e materno, eu dispenso deste meu enfadonho discurso.
Que voltem à sua felicidade abençoada.
Porém,  a aqueles que, conscientemente ou não, porventura tenham sequer desconfiado da inexistência do amor por parte daqueles que os receberam neste mundo dedico estas letras.
Lendo a obra de Freud e o livro "princípios da psicanálise", volume II de Marco Antonio Coutinho Jorge entrei em contato com as teorias que falam das condições afetivas que cercam o advento do bebê ao mundo.
Num trabalho primoroso
René Spitz, após conhecer a psicanálise a partir de Freud, estuda o desejo pela vida ou pela morte do bebê a partir da  percepção de ser desejado ou não.  Spitz nota que, ao ser acolhido amorosamente nasce no bebê a pulsão de vida e ele movimenta-se positivamente em direção ao seu bom desenvolvimento porém, se rejeitado ou se o amor e cuidados ideais não lhe são oferecidos aparece nele a pulsão de morte e ele usa os "meios de morte" disponíveis para "ir embora" ou melhor,  para voltar para o estado de antes do nascimento.
É como se a criança dissesse --" aqui não me querem então vou-me embora. "
A morte torna-se, então, a solução para um caso de desamor.
Mas e para aquelas crianças que decidem ficar apesar do desamor ou aquelas que deixaram de ser amadas ou que tiveram a confiança no amor traida pelos abusos? Ou para aquelas cujos sinais de amor não foram claros e deixaram nelas a dúvida sobre a sua real existência?  Para estas, o que resta?
Posso imaginar às indagações que estes sujeitos carregam ao longo das suas dolorosas vidas.
Estas vidas serão vividas como uma eterna procura pelo amor nunca oferecido pelos entes que às chamaram e às receberam.
Perguntas como:
Porque ninguém me ama?
Porque ninguém me apóia?
Pra que eu sirvo?
Ou pior, afirmações como:
Eu me odeio;
Sou inútil;
Não valho nada;
Não sou ninguém, são, ao meu ver expressões sintomáticas da lacuna deixada pela falta do amor primordial.
É como se houvesse uma intensa e continua vontade de morrer.  É a pulsão de morte agindo com potência e liberdade pouco contida pela pulsão de vida. É a vontade de retorno ao nada primordial de onde todos viemos.  A vontade de retorno ao útero a procura de uma nova oportunidade de nascer num mundo que venha a nos amar e desejar.
O amor familiar e às relações harmônicas e amorosas entre os membros da família trazem à criança uma "certeza de segurança" que a leva a explorar o mundo sem grandes medos, com grande interesse e alegria mas, para aqueles que não tiveram, como substrato, este modelo ideal de família ou que, ao longo dos anos cruciais da infância, perderam este amor e, consequentemente,  esta segurança a exploração do mundo será uma imposição contingente cercado por medos horríveis.  Para estes a vida não terá sentido ou objeto e será um tormentoso tédio.
Ao mesmo tempo, a esperança de um amor e de uma segurança que nunca chega faz desenvolver-se uma terrível ansiedade.
Creio que a solução seria, em primeiro lugar, trazer a consciência do sujeito vítima destes estados a verdade afetiva sobre o seu advento.  Deve ele se lembrar e "verbalizar" aquilo que ele percebe como verdade com relação a aqueles que o trouxeram ao mundo. Isto será a base para a terapia que trará a cura. 
Portanto, você que se encaixa neste perfil e que me lê agora, faça uma auto análise das condições afetivas que cercaram o seu nascimento e infância e às verbalize. Fale com você mesmo mas seja honesto.  Análise os motivos que levaram aqueles que o cercavam a agirem de forma não amorosa.  Análise e tente identificar às origens das dúvidas sobre o amor que, aparentemente, não lhe foi oferecido.  Traga a verdade a superfície iluminada para que possa ser encarada e transformada em cura.
A verdade sobre você te libertará.
Te desejo a auto suficiencia.

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